Jacto errático apanhado em flagrante

2003-07-09

Estas imagens em raios-X obtidas com o Chandra mostram a variação errática do jacto de partículas de alta energia associado ao pulsar de Vela, uma estrela de neutrões que roda rapidamente. Estas imagens pertencem a uma série de 13 imagens obtidas ao longo de dois anos e meio. O campo é de 1,6x1,2 minutos de arco. Crédito: NASA/CXC/PSU/G. Pavlov et al.
Um filme resultante de uma série de observações em raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
, realizadas pelo observatório espacial Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
), revelou a presença de um jacto extraordinariamente errático que varia de um modo nunca antes visto. O jacto de partículas de alta energia move-se a cerca de metade da velocidade da luz
velocidade da luz
A velocidade da luz é a rapidez com que se propagam as ondas luminosas (ou radiação electromagnética). No vácuo, é igual a 299 790 km/s, sendo independente do referencial considerado.
como se fosse uma mangueira deixada à solta. Este comportamento traz aos cientistas um entendimento mais profundo da natureza dos jactos provenientes de pulsares e de buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
.

O Chandra observou 13 vezes, entre Janeiro de 2000 e Agosto de 2000, o pulsar de Vela (uma estrela de neutrões
estrela de neutrões
Uma estrela de neutrões é o remanescente de uma estrela de massa elevada que explodiu como supernova. Trata-se de um objecto muito compacto constituído essencialmente por neutrões, com apenas cerca de 10 a 20 km de diâmetro, uma densidade média entre 1013 e 1015 g/cm3, uma temperatura central de 109 graus e um intenso campo magnético de 1012 gauss.
com rotação rápida). Estas observações, que foram concebidas para estudar a natureza dos jactos de matéria e antimatéria
antimatéria
Designa-se por antimatéria a matéria constituída por antipartículas, tais como antiprotões, antineutrões e positrões. A maior parte do Universo observável é formado de matéria constituída por partículas e não de antimatéria.
provenientes do pulsar, levaram à descoberta de que um jacto exterior de partículas se dobrava e movia para os lados a velocidades fenomenais. O jacto, que tem um comprimento de meio ano-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
, muda de forma e de brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
num curto intervalo de tempo. Nunca antes se tinha visto uma variabilidade tão forte e rápida num jacto.

O filme mostra como numa questão de semanas o jacto deixa de ser rectilíneo para assumir uma forma de gancho, e enquanto isso, manchas brancas deslocam-se ao longo do jacto a metade da velocidade da luz. O jacto é composto por electrões
electrão
Partícula elementar pertencente à família dos leptões - partículas sujeitas à interacção nuclear fraca, electromagnética e gravitacional. Os electrões possuem carga eléctrica negativa e encontram-se nos átomos de todos os elementos químicos, orbitando à volta do núcleo atómico, que possui carga eléctrica positiva.
ou positrões
positrão
O positrão é a antipartícula do electrão.
(equivalentes, na antimatéria, aos electrões), com uma energia extremamente elevada, que se movem em espiral à volta de um campo magnético
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
. Estas partículas são criadas e aceleradas por voltagens 100 milhões de vezes superiores à de um relâmpago. Por sua vez, estas voltagens são geradas pela acção combinada da rotação rápida do pulsar com o seu intenso campo magnético.

A espessura do jacto permanece aproximadamente constante ao longo de todo o seu comprimento. Esta configuração sugere que o jacto está confinado por campos magnéticos gerados por electrões que fluem ao longo do eixo do jacto. Estudos realizados em laboratório mostram que jactos ou feixes podem mudar rapidamente devido a um efeito designado por instabilidade de mangueira.

Imagine-se uma mangueira no chão. Depois de se ligar a água, ver-se-ão diferentes zonas da mangueira a saltar e a mover-se rapidamente em diferentes direcções, devido à maior pressão existente nas dobras da mangueira. O jacto de Vela assemelha-se a uma mangueira feita de campos magnéticos que confina as partículas com carga eléctrica.

A instabilidade pode ter sido causada pelo forte vento criado à medida que o pulsar se move através do gás circundante, a uma velocidade de 300 000 km/h. Julga-se que as manchas brilhantes são uma manifestação do aumento do campo magnético e da pressão das partículas nas dobras.

O brilho observado na zona exterior do jacto, bem como os movimentos rápidos do jacto e das manchas indicam que os arcos brilhantes à volta do pulsar podem não ser anéis à volta do equador, como se pensava antes, mas sim ondas de choque
onda de choque
Uma onda de choque é uma variação brusca da pressão, temperatura e densidade de um fluído, que se desenvolve quando a velocidade de deslocação do fluído excede a velocidade de propagação do som.
provocadas pela parte interior do jacto ao atravessar a nuvem de partículas que envolve o pulsar.

O estudo dos jactos dos pulsares é importante não só para a compreensão do funcionamento destes objectos, mas também pode ajudar a percebermos a natureza dos enormes jactos provenientes dos buracos negros de grande massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
. Esses jactos podem também variar, ainda que numa escala de milhões de anos, em vez de semanas como se verifica no jacto da pulsar de Vela.

O filme pode ser visto em: http://chandra.harvard.edu/photo/2003/vela_pulsar/animations.html

Fonte da notícia: http://chandra.harvard.edu/press/03_releases/press_063003.html