Eis uma hipernova!

2003-04-10

Fotografia de um dos pequenos telescópios ROTSE, no Observatório de Siding Spring, na província australiana de Nova Gales do Sul, acompanhado dum cientista australiano. Crédito: A. Phillips (Univ. of New South Wales).
Há muito tempo, numa galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
muito, muito distante, uma estrela gigante
estrela gigante
Uma estrela gigante é uma estrela que terminou o processo de fusão de hidrogénio no seu núcleo e, por isso, arrefeceu e expandiu-se. As estrelas gigantes são o estado evoluído das estrelas anãs. Terminada a fusão de hidrogénio em hélio no núcleo, pode ocorrer um dos seguintes processos, ou os dois: a fusão de hidrogénio em hélio numa camada à volta do núcleo, ou a fusão de hélio em carbono e oxigénio no núcleo. As estrelas gigantes são muito luminosas: num diagrama Hertzsprung-Russell, o ramo das estrelas gigantes é mais luminoso do que a sequência principal. Exemplo de estrelas gigantes próximas de nós: Aldebarã, Arturus e Capela.
explodiu, libertando quantidades incríveis de energia, para depois colapsar e formar um buraco negro
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
. A luz dessa explosão, ocorrida há cerca de dois mil milhões de anos, atingiu finalmente a Terra às 11h37m (hora de Lisboa), na manhã do dia 29 de Março, desencadeando um frenesim na comunidade astronómica. Este fenómeno foi designado por hipernova, fazendo alusão às conhecidas supernovas
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
, os objectos que marcam o final violento das estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
elevada.

Com o auxílio de dois telescópios gémeos, separados de 110° em longitude, o Robotic Optical Transient Search Experiment (ROTSE) fará uma monitorização ininterrupta da luz proveniente desta explosão recentemente observada.

Segundo Carl W. Alerkof, astrofísico do Departamento de Física da Universidade de Michigan (EUA) e investigador responsável pelo projecto ROTSE, o brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
desta fulguração
fulguração
Uma fulguração é uma libertação de energia de forma explosiva da qual resulta um aumento rápido do brilho do astro no qual ocorre. São exemplo deste tipo de fenómenos as fulgurações solares, associadas às manchas solares, bem como as fulgurações de raios-X, que ocorrem em estrelas de neutrões, e de raios gama, que se sabe estarem relacionadas com as explosões de supernova.
de raios gama
raios gama
Os raios gama são a componente mais energética e mais penetrante de toda a radiação electromagnética. Os fotões gama possuem energias elevadíssimas, tipicamente superiores a 10 keV, às quais correspondem comprimentos de onda inferiores a umas décimas do Ångstrom. Este tipo de radiação é, por exemplo, emitido espontaneamente por núcleos atómicos de algumas substâncias radioactivas.
, na banda do visível, é espantoso, sendo cerca de 100 vezes mais brilhante do que qualquer outro objecto já estudado no Universo observado. Além disso, Carl Alerkof afirma que se trata da fulguração mais próxima da Terra até hoje detectada, de entre as fulgurações de origem cosmológica (consultar neste portal uma notícia, de Janeiro de 2002, relatando a descoberta de uma subclasse de fulgurações locais, a menos de 325 milhões de anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
).

Muito recentemente, o consórcio ROTSE instalou dois telescópios na Austrália e no Texas (EUA), esperando a primeira oportunidade para usar este novo equipamento. Esta fulguração foi detectada pelo satélite da NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
High-Energy Transient Explorer (HETE-2
High Energy Transient Explorer (HETE)
Satélite da NASA, colocado em órbita a 9 de Outubro de 2000, concebido para efectuar o primeiro estudo, em múltiplos comprimentos de onda, das fulgurações de raios gama, possuindo instrumentos sensíveis aos raios ultravioleta, raios-X, e raios gama. Uma característica única deste observatório é a capacidade de localizar fulgurações de raios gama com uma precisão de 10 segundos arco e de, quase em tempo real, enviar a posição medida para uma rede de observatórios terrestres, o que permite uma rápida monitorização no rádio, infravermelho e visível.
), mas foi necessária a intervenção humana para descobrir a sua localização no céu. Apesar das nuvens esporádicas e de alguma chuva que se faziam sentir na Austrália, o instrumento ROTSE, no Observatório de Siding Spring localizado na província de Nova Gales do Sul, conseguiu registar o decaimento do brilho da fulguração. Doze horas mais tarde, o segundo telescópio, situado em Fort Davis, no Texas, registava o fenómeno por sua vez.

Durante o primeiro minuto a seguir à explosão, a fulguração emitiu energia a uma taxa mais de um milhão de vezes superior ao conjunto de todas as estrelas que existem na nossa galáxia. Isto equivale a imaginar a energia total libertada pelo nosso Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
durante toda a sua vida (quando morrer, o Sol terá cerca de 9 mil milhões de anos de idade) concentrada em apenas uma décima de segundo!

Sendo as explosões de maior potência em todo o Universo, as fulgurações de raios gama
fulguração de raios gama
Uma fulguração de raios gama é uma potentíssima explosão, com consequente libertação de fotões gama, que ocorre em direcções aleatórias no céu. Descobertas acidentalmente nos anos 1960, sabe-se que algumas delas estão associadas a um tipo particular de supernovas, as explosões que marcam o fim da vida de uma estrela de massa elevada.
são muito difíceis de estudar porque se encontram a enormes distâncias, dão-se sem aviso prévio e raramente duram mais de um minuto. Telescópios robotizados pequenos, rápidos e relativamente baratos são, por isso, a melhor solução para tentar detectar estes fenómenos. Dois telescópios adicionais da rede ROTSE, a ser instalados na Namíbia e Turquia, estão já previstos. O objectivo é dispor de telescópios que permitam uma monitorização contínua de todo o céu nocturno, e daí estarem espalhados pelo planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
: em cada instante, haverá sempre um telescópio ROTSE num local onde seja noite.

Fonte da notícia: http://www.umich.edu/news/Releases/2003/Apr03/r040303c.html