A Grande Mancha Escura de Júpiter

2003-03-18

A Grande Mancha Escura de Júpiter vista pela sonda Cassini no ultravioleta durante o ano 2000. Crédito: NASA.
Bob West, do Laboratório de Propulsão a Jacto (EUA), sabia da existência duma mancha escura de Júpiter
Júpiter
Júpiter é o quinto planeta mais próximo do Sol. Com um diâmetro cerca de 11 vezes maior do que a Terra e uma massa mais de 300 vezes superior, é o maior planeta do Sistema Solar e o primeiro dos planetas gigantes gasosos.
devido a uma imagem breve feita com o telescópio espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
), em 1997, na banda do ultravioleta
ultravioleta
O ultravioleta á a banda do espectro electromagnético que cobre a gama de comprimentos de onda entre os 91,2 e os 350 nanómetros. Esta radiação é largamente bloqueada pela atmosfera terrestre.
. Contudo, nessa altura, esta mancha só apareceu numa das inúmeras imagens que o Hubble fez, o que deixou os astrónomos intrigados e sem saber muito bem o que fazer dela.

Mais recentemente, a sonda Cassini
Cassini-Huygens (NASA/ESA)
A missão Cassini-Huygens é uma missão conjunta da NASA e da ESA dedicada a Saturno que foi lançada no dia 13 de Outubro de 1997. Esta missão é composta por duas sondas: a sonda Cassini cujo objectivo principal é o estudo de Saturno, da sua atmosfera e do seu campo magnético, e a sonda Huygens cujo objectivo é o estudo da atmosfera do maior satélite de Saturno, Titã. O ponto alto desta missão será sem dúvida o pouso da sonda Huygens na superfície de Titã.
(NASA), que passou em Júpiter no ano 2000, obteve imagens detalhadas da região polar norte do planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
gigante. Nas primeiras sequências de imagens não foi observado nada de novo, apenas nuvens usuais da região polar. Mas, nas semanas seguintes, a câmara a bordo da Cassini registou uma grande mancha escura a desenvolver-se, com tamanho semelhante à bem conhecida Mancha Vermelha, isto é, um diâmetro equivalente a duas Terras.

Esta nova mancha é efémera, sendo provavelmente por isso que o Hubble a observou uma só vez. Se a Cassini tivesse passado em Júpiter um ou dois meses mais cedo, ou mais tarde, talvez não desse por ela de todo. Mas a sorte fez com que as câmaras da Cassini obtivessem imagens durante 11 semanas seguidas, o que permitiu aos astrónomos retirar algumas conclusões importantes.

Esta mancha escura é muito diferente da Grande Mancha Vermelha
Grande Mancha Vermelha de Júpiter
A Grande Mancha Vermelha de Júpiter é uma tempestade de altas-pressões que cobre uma área de 40000 km por 15000 km, no hemisfério Sul de Júpiter. A sua cor e intensidade variam com o tempo e já é observada há mais de 100 anos: no século 17, Cassini já a integrava nos seus esboços do planeta.
. Enquanto que a mancha vermelha é profunda, sendo um sistema (ou tempestade) de alta pressão localizado na troposfera de Júpiter, bem abaixo do topo das nuvens, a mancha escura é, aparentemente, pouco profunda e está confinada à alta estratosfera. Bob West acredita que esta mancha constitui um efeito colateral das auroras
aurora
A aurora é a luz emitida pelos iões da atmosfera terrestre, principalmente nos pólos geomagnéticos da Terra, estimulada pelo bombardeamento de partículas de alta energia ejectadas pelo Sol. As auroras aparecem dois dias depois das fulgurações solares, proporcionando um espectáculo de rara beleza, e atingem o seu pico cerca de dois anos depois do máximo de manchas solares. As auroras boreais e austrais são observáveis a latitudes elevadas no hemisfério Norte e hemisfério Sul, respectivamente.
em Júpiter. Tal como na Terra, existem auroras no pólo norte de Júpiter, embora centenas ou milhares de vezes mais potentes. Contudo, em Júpiter, e ao contrário da Terra, as auroras não resultam apenas do vento solar
vento solar
O vento solar é um vento contínuo de plasma quente que tem origem na coroa solar e preenche o espaço interplanetário do Sistema Solar. A 1 UA do Sol (ou seja, à distância da Terra ao Sol), a velocidade do vento solar é de cerca de 450 km/s e a densidade é aproximadamente 7 protões/cm3. O vento solar confina o campo magnético da Terra e é responsável por fenómenos como tempestades geomagnéticas e auroras. O Sol ejecta cerca de 10-13 da sua massa por ano via vento solar.
. O campo magnético
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
de Júpiter é de tal maneira intenso que funciona como um gigantesco reservatório de partículas carregadas. Estas partículas são aceleradas na direcção do pólo, ionizando o gás aí existente. Isto significa que, em Júpiter, as auroras ocorrem quase sempre.

As partículas carregadas não só provocam auroras, como são capazes de dissociar a molécula
molécula
Uma molécula é a unidade mais pequena de um composto químico, sendo constituída por um ou mais átomos, ligados entre si pelas interacções dos seus electrões.
do gás metano (CH4), que é mais abundante em Júpiter do que na Terra. Fragmentos de CH4 combinam-se com hidrogénio para formar acetileno (C2H2) que, reagindo com moléculas contendo carbono e hidrogénio, permite formar moléculas ainda mais complexas. Estas, eventualmente, condensam em gotículas escuras.

Se a hipótese de Bob West estiver correcta, a Grande Mancha Escura é, precisamente, um nevoeiro de gotículas ricas em hidrocarbonetos que pairam nas camadas mais altas da estratosfera de Júpiter. Um tal nevoeiro seria proeminente em imagens de ultravioletas porque as gotículas ricas em hidrocarbonetos absorvem fortemente a radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
ultravioleta (aliás, a Grande Mancha Escura é invisível à vista humana, só podendo ser observada no ultravioleta).

No entanto, fica por esclarecer qual a origem desta mancha escura transitória. Por que razão se terá formado? Para esta questão os astrónomos ainda não arranjaram resposta.

Um conjunto de animações muito interessantes da atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
em Júpiter pode ser consultado na fonte da notícia indicada em baixo.

Fonte da notícia: http://science.nasa.gov/headlines/y2003/12mar_darkspot.htm