Tempestades ascendentes fazem repensar o significado das faixas de Júpiter

2003-03-14

Júpiter crescente visto pela sonda Cassini, 17 dias depois da aproximação máxima. Esta imagem é, na realidade, um mosaico contruído a partir de várias imagens mais pequenas, tomadas a uma distância de 18,3 milhões de quilómetros do planeta. As estruturas menores que se podem ver têm uma secção de cerca de 110 km. Io, que das 4 grandes luas de Júpiter é a mais interior, aparece também em crescente, à esquerda do planeta gigante. Crédito: NASA/JPL/University of Arizona.
Imagens de Júpiter
Júpiter
Júpiter é o quinto planeta mais próximo do Sol. Com um diâmetro cerca de 11 vezes maior do que a Terra e uma massa mais de 300 vezes superior, é o maior planeta do Sistema Solar e o primeiro dos planetas gigantes gasosos.
, tomadas pela sonda Cassini
Cassini-Huygens (NASA/ESA)
A missão Cassini-Huygens é uma missão conjunta da NASA e da ESA dedicada a Saturno que foi lançada no dia 13 de Outubro de 1997. Esta missão é composta por duas sondas: a sonda Cassini cujo objectivo principal é o estudo de Saturno, da sua atmosfera e do seu campo magnético, e a sonda Huygens cujo objectivo é o estudo da atmosfera do maior satélite de Saturno, Titã. O ponto alto desta missão será sem dúvida o pouso da sonda Huygens na superfície de Titã.
- uma das duas sondas da missão Cassini-Huygens (NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
/ISA) - no seu caminho para Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
, estão a levar os astrónomos a abandonar uma das ideias, há muito aceite, sobre Júpiter, e a aceitar precisamente a ideia contrária.

Há muito que sabemos que a aparência de Júpiter é dominada por faixas (ou cinturões) escuras, alternadas com zonas mais claras. Desde há muito que os cientistas consideram as zonas claras, com as suas nuvens, como sendo áreas onde a atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
tem um movimento ascendente, em parte porque muitas das nuvens na Terra se formam quando o ar sobe. Com base no principio de que se algo sobe também deve descer, os cinturões escuros têm sido encarados como áreas onde o ar desce.

No entanto, imagens tomadas pela sonda Cassini mostram que células de tempestade constituídas por nuvens brancas e brilhantes em ascensão, demasiado pequenas para serem vistas da Terra, aparecem quase sem excepção nos cinturões escuros. Imagens provenientes de uma missão anterior já tinham dado indicações neste sentido, mas não de um modo tão evidente como as novas imagens de 43 tempestades diferentes. Este dado observacional conduz a um novo quadro, no qual os cinturões escuros são áreas de movimento ascendente da atmosfera de Júpiter e as zonas claras são regiões de movimento descendente, precisamente o contrário do que se tem admitido nos últimos 50 anos!

A câmara da sonda Cassini tomou cerca de 26 000 imagens de Júpiter, dos seus débeis anéis, e das suas luas ao longo de um período de seis meses, quando passou perto do planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
, há cerca de dois anos. Os diferentes ângulos com que a sonda observou o anel principal de Júpiter dão informação acerca das partículas do anel pelo modo como dispersam a luz do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
. O que se observou é que as partículas têm uma forma irregular, e não esférica. Provavelmente, as partículas provêm das superfícies de uma ou mais luas devido à erosão causada por impactos de meteoroides. Se as partículas fossem esféricas a sua origem estaria em gotículas derretidas, e não em erosão. Além disso, as imagens tomadas por Cassini mostram que a inclinação das órbitas
inclinação de uma órbita
A inclinação da órbita de um astro é definida pelo ângulo entre o plano orbital do astro e outro plano de referência. No caso de um planeta do Sistema Solar, o plano de referência é o plano da órbita terrestre; no caso de um satélite, a referência é geralmente o plano equatorial do planeta.
de duas pequenas luas próximas do anel, Metis e Adrasta, condizem com a espessura do anel, o que sugere que são estas luas as fontes das partículas do anel.

Imagens da região polar norte de Júpiter, tomadas no ultravioleta
ultravioleta
O ultravioleta á a banda do espectro electromagnético que cobre a gama de comprimentos de onda entre os 91,2 e os 350 nanómetros. Esta radiação é largamente bloqueada pela atmosfera terrestre.
, revelaram a presença de uma surpreendente bruma, com uma forma oval, que gira na alta atmosfera e tem o tamanho da famosa Grande Mancha Vermelha
Grande Mancha Vermelha de Júpiter
A Grande Mancha Vermelha de Júpiter é uma tempestade de altas-pressões que cobre uma área de 40000 km por 15000 km, no hemisfério Sul de Júpiter. A sua cor e intensidade variam com o tempo e já é observada há mais de 100 anos: no século 17, Cassini já a integrava nos seus esboços do planeta.
. É um fenómeno nunca visto até agora e que dá informação acerca do funcionamento da circulação da estratosfera, mostrando os ventos e os ciclos de vida das nuvens na estratosfera.

Por outro lado, animações criadas a partir de imagens no infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
revelam bandas duradouras de ventos circum-planetários que se estendem a norte das faixas escuras e claras. A aparência do planeta a altas latitudes é a de uma pele de leopardo, mas quando se observa em movimento é interessante notar que todas as manchas situadas a uma determinada latitude se movem numa direcção e que todas as manchas situadas a latitudes adjacentes se movem em direcção contrária.

Outras descobertas trazidas pela Cassini incluem a luminescência atmosférica das grandes luas, Io e Europa, observada durante eclipses
eclipse
Um eclipse é uma ocultação total ou parcial de um corpo celeste, quando outro corpo passa entre este e o observador.
, um filamento vulcânico sobre a região polar norte de Io, e a forma irregular de Himalia, uma pequena lua exterior.

Imagens e animações de Júpiter criadas a partir dos dados de Cassini podem ser vistas em nos seguintes endereços na Web:

http://saturn.jpl.nasa.gov/gallery/jupiter-flyby/index.cfm
http://ciclops.lpl.arizona.edu/ciclops/images_jupiter.html

Os resultados de Júpiter dão-nos um cheirinho das fantásticas novas descobertas que nos esperam quando Cassini chegar a Saturno. A nave começará a orbitar Saturno no dia 1 de Julho de 2004, e soltará a sonda Huygens (que leva acoplada e que descerá em Titã, a maior lua de Saturno e a segunda maior lua em todo o Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
) cerca de seis meses depois.

Fonte da notícia: http://www.jpl.nasa.gov/releases/2003/31.cfm