Anéis de Úrano observados pelo VLT

2003-01-18

Imagem de Úrano a 2,2μm (banda KS) obtida pela câmara ISAAC do VLT. Neste comprimento de onda, o contraste entre o disco do planeta e os anéis é realçado. Sete luas de Úrano estão identificadas. Crédito: ESO.
O VLT
Very Large Telescope (VLT)
O Very Large Telescope é um observatório operado pelo Observatório Europeu do Sul (ESO) e localizado no Cerro Paranal, no deserto de Atacama, no Chile. O VLT é composto por 4 telescópios de 8,2 m de diâmetro que podem trabalhar simultaneamente, constituindo um interferómetro óptico, ou independentemente.
(ESO
European Southern Observatory (ESO)
O Observatório Europeu do Sul é uma organização europeia de Astronomia para o estudo do céu austral fundada em 1962. Conta actualmente com a participação de 10 países europeus e ainda do Chile. Portugal tornou-se membro do ESO em 1 de Janeiro de 2001, no seguimento de um acordo de cooperação que durou cerca de 10 anos.
) obteve uma imagem invulgar dum bem conhecido objecto do sistema solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
. Não se preocupe se julgou tratar-se de um bonita fotografia amadora do planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
, o Senhor dos Anéis. No entanto, o brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
relativo e as posições das luas não parecem familiares... e o sistema de anéis é brilhante demais quando comparado com o disco do planeta.

Pois não se trata de Saturno, mas sim de Úrano
Úrano
É o sétimo planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 4 vezes superior ao da Terra é o terceiro planeta gigante gasoso. A sua característica mais marcante é o facto de o seu eixo de rotação estar inclinado cerca de 97º em relação à eclíptica.
, o planeta gigante que se lhe segue, localizado a cerca de 3 000 milhões de quilómetros de nós, ou seja, a 20 vezes a distância Sol-Terra. A imagem apresenta Úrano com os seus anéis e algumas das suas luas. É uma imagem no infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
obtida na banda KS (centrada no comprimento de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
de 2,2 μm) com o instrumento ISAAC no telescópio ANTU de 8,2 metros do VLT. Os observadores, Emmanuel Lellouch e Thérése Encrenaz (Observatório de Paris, França) e Jean-Gabrel Cuby e Andreas Jaunsen (ESO-Chile), obtiveram uma exposição de 5 minutos sob excelentes condições de observação, em Novembro de 2002, durante um programa de investigação planetária. O diâmetro angular de Úrano é de 3,5 segundos de arco
segundo de arco (")
O segundo de arco (") é uma unidade de medida de ângulos, ou arcos de circunferência, correspondente a 1/60 de minuto de arco, ou seja, 1/3600 de grau.
!

Os anéis de Úrano foram descobertos em 1977 durante uma ocultação
ocultação
Designa-se por ocultação a ausência de luz proveniente de um objecto celeste devido à sua passagem por detrás de outro objecto celeste. Por exemplo, o eclipse do Sol é uma ocultação do Sol.
estelar observada por equipas de astrónomos no Observatório Kuiper Airborne (um avião que voava no topo da atmosfera terrestre
atmosfera terrestre
A atmosfera terrestre é composta por um conjunto de camadas gasosas que envolvem a Terra. Estas camadas são designadas por Troposfera (da superfície da Terra até cerca de 10 km de altitude), Estratosfera (10 - 50 km), Mesosfera (50 - 100 km), Termosfera (100 - 400 km) e Exosfera (acima dos 400 km).
e transportava um telescópio de infravermelhos) e no Observatório de Perth (Austrália). Antes e depois de Úrano passar na frente da estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
ocultada, os seus anéis provocaram a diminuição do brilho da estrela durante pequenos intervalos de tempo e foram assim descobertos. Posteriormente, em 1986, fotografias obtidas pela Voyager-2 (NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) revelaram uma multitude de anéis ténues.

Estes anéis não são detectáveis a partir da Terra quando observados em comprimentos de onda no domínio do visível. No entanto, na imagem de infravermelhos obtida pelo VLT, o contraste entre os anéis e o planeta é significativo: no comprimento de onda a que se realizaram as observações (2,2 μm), a luz solar que chega a Úrano é quase toda absorvida pelo metano gasoso presente na atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
do planeta, fazendo com que o seu disco pareça invulgarmente escuro, enquanto que os gelos que compõem os anéis refletem a luz solar, tornando por isso os anéis comparativamente mais brilhantes.

Úrano é único entre os planetas do sistema solar por ter um eixo de rotação tão inclinado que se aproxima do plano principal do sistema solar no qual quase todos os planetas se movem: a eclíptica
eclíptica
A eclíptica é a linha de intersecção do plano da órbita da Terra à volta do Sol com a esfera celeste. Coincide com a trajectória aparente que o Sol descreve ao longo das 12 constelações do Zodíaco e ainda da Constelação de Ofiúco, durante um ano terrestre. Dado que o equador da Terra faz um ângulo de 23°27'30'' com o plano da órbita da Terra, a eclíptica também faz um ângulo de 23°27'30'' com o equador celeste, intersectando-o nos dois pontos equinociais.
. Quando a Voyager-2 fotografou Úrano, em 1986, o pólo sul do planeta estava orientado na direcção da Terra. Agora, 16 anos decorridos, que correspondem a cerca de um quinto dos 84 anos do período de revolução
período orbital
O tempo necessário para que um corpo descreva uma órbita completa e fechada em torno de outro corpo.
de Úrano, observamo-lo com o seu sistema de anéis sob um ângulo que é comparável àquele sob o qual se observa Saturno quando o sistema está mais "aberto".

Na imagem ao lado estão identificadas sete luas de Úrano. As mais visíveis são Titania e Oberon. A primeira foi descoberta em 1787 pelo descobridor de Úrano, William Herschel (1738-1822), na altura a trabalhar em Bath (Inglaterra). Ariel e Umbriel foram descobertas em 1851 por William Lassell (1799-1880), em Liverpool (Inglaterra). Miranda foi descoberta em 1948 por Gerard Kuiper
Gerard Kuiper (1905-1973)
Astrónomo americano, nascido na Holanda, G. Kuiper é considerado um dos pais da Ciência Planetária moderna pelo seu estudo aprofundado do Sistema Solar. Desenvolveu novas técnicas de observação, estudou pormenorizadamente a superfície da Lua, descobriu Miranda (satélite de Neptuno), Nereida (satélite de Úrano), e a atmosfera de Titã. Em 1951, sugeriu a existência de uma cintura de corpos gelados depois de Neptuno - a chamada Cintura de Kuiper.
(1905-1973), na Califórnia (EUA). As pequenas e pouco brilhantes Puck e Portia foram descobertas por Stephen Synnott em 1985-86, durante um estudo das fotografias obtidas pela Voyager-2, pouco depois da nave ter voado por Úrano em Janeiro de 1986.

Fonte da notícia: http://www.eso.org/outreach/press-rel/pr-2002/phot-31-02.html