Maior aproximação em quase um século do asteróide que coorbita o Sol com a Terra!

2003-01-08

Em cima: Ilustração da órbita em forma de ferradura de um hipotético asteróide que coorbita o Sol com a Terra, vista num referencial que se move com a Terra, ou seja, em que esta permanece estacionária. Em baixo: órbita mais realista do asteróide 2002 AA29 que coorbita o Sol com a Terra, sem nunca a ultrapassar. Ao percorrer a ferradura de uma ponta à outra, na verdade o asteróide não permanece numa trajectória como a descrita acima, mas vai descrevendo espirais como as ilustradas nesta figura. Crédito: Paul Wiegert.
Em Janeiro de 2002, foi descoberto um asteróide
asteróide
Um asteróide é um pequeno corpo rochoso que orbita em torno do Sol, com uma dimensão que pode ir desde os 100 m até aos 1000 km. A maioria dos asteróides encontra-se entre as órbitas de Marte e de Júpiter. Também são designados por planetas menores.
no âmbito do programa LINEAR (um projecto norte-americano de busca de asteróides) que recebeu o nome 2002 AA29. Esta pedra do espaço com 60 metros de diâmetro é o primeiro asteróide descoberto a coorbitar o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
com a Terra, ou seja, cuja órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
em torno do Sol é muito semelhante à da Terra. Talvez ainda mais interessante seja o facto de ele apresentar uma órbita invulgar relativamente à Terra, descrevendo a forma de uma ferradura ao fim de 190 anos.

De acordo com uma equipa internacional de astrónomos que publicou o seu relatório em Outubro de 2002 na revista da especialidade Meteoritics & Planetary Science, o asteróide ora lidera, ora segue a Terra à volta do Sol, sem nunca a ultrapassar. Neste momento, o asteróide encontra-se numa órbita ligeiramente exterior à órbita da Terra e, por isso, desloca-se mais lentamente, estando a Terra quase a alcançá-lo. A 8 de Janeiro de 2003, o pequeno corpo passou a cerca de 5,9 milhões de quilómetros de nós, na sua maior aproximação à Terra em quase um século, mas só observável através de grandes telescópios. Mas nessa altura, a combinação dos efeitos gravitacionais da Terra e do Sol provocou no asteróide um empurrão para uma órbita ligeiramente interior à órbita da Terra e, por isso, mais rápida. 2002 AA29 começará a adiantar-se em relação à Terra, distanciando-se de nós progressivamente. Em 2098, o seu avanço será tal que quase se adiantou numa volta, alcançando a Terra por detrás. Ao aproximar-se, será novamente desviado da sua órbita, desta vez para o exterior da órbita terrestre, perdendo velocidade e não ultrapassando a Terra no seu movimento em torno do Sol. Então, será a Terra a deslocar-se mais rapidamente adiantando-se ao asteróide, e em 2193 estarão na mesma configuração em que se encontram agora. Relativamente à Terra, ao fim de 190 anos o asteróide descreveu uma ferradura, como se ilustra na figura ao lado.

Mas os cálculos realizados indicam ainda outra particularidade: daqui a 600 anos, o asteróide entrará num modo quase-satélite. Nessa altura, em vez de evitar a vizinhança da Terra, o asteróide ficará temporariamente preso na abertura da ferradura. Relativamente à Terra, o asteróide terá um movimento semelhante a um satélite em órbita terrestre com um período aparente de um ano. Mas o que os mantém próximos um do outro não é a interacção gravitacional entre eles, mas simplesmente o facto do asteróide deslocar-se à volta do Sol quase à mesma velocidade do que a Terra. Passados 40 anos, 2002 AA29 escapará ao modo quase-satélite e retomará o modo da ferradura. O último período de movimento quase-satélite foi por volta de 550 DC, mas por se tratar de um objecto tão pequeno não há registos de ter sido observado. O facto de fazer a transição de movimento em forma de ferradura para quase-satélite é mais um motivo para tornar este asteróide extremamente interessante, pois é único.

A maioria dos asteróides encontra-se na cintura de asteróides
Cintura de Asteróides
A Cintura de Asteróides é a região do Sistema Solar situada entre Marte (1,5 UA) e Júpiter (5,2 UA), no plano da eclíptica, onde se encontra a maior parte dos asteróides.
entre Marte
Marte
Marte é o quarto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. É o último dos chamados planetas interiores. O seu diâmetro é cerca de 50% mais pequeno do que o da Terra e possui uma superfície avermelhada, sendo também conhecido como planeta vermelho.
e Júpiter
Júpiter
Júpiter é o quinto planeta mais próximo do Sol. Com um diâmetro cerca de 11 vezes maior do que a Terra e uma massa mais de 300 vezes superior, é o maior planeta do Sistema Solar e o primeiro dos planetas gigantes gasosos.
, longe da Terra. Mesmo os asteróides que por vezes passam perto da Terra têm normalmente órbitas que alcançam a cintura. Exemplos de asteróides que coorbitam com planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
são bem conhecidos relativamente aos planetas Júpiter e Marte, mas este é o primeiro asteróide a ser descoberto que coorbita com a Terra à volta do Sol num trajecto muito semelhante ao da Terra.

A hipótese da existência de uma população de asteróides coorbitando com a Terra no seu movimento em torno do Sol é testada em modelos teóricos desenvolvidos pela astrónoma portuguesa Helena Morais (Centro de Astronomia e Astrofísica de Lisboa) e Allesandro Morbidelli (Observatório de Nice, França) num artigo aceite para publicação na revista da especialidade Ícarus. A comparação das previsões teóricas com as observações, de que 2002 AA29 é exemplo, são extremamente importantes na caracterização desta população. Espera-se encontrar mais asteróides cujo movimento em torno do Sol se assemelhe ao da Terra, e estes certamente se tornarão alvos de missões espaciais, podendo mesmo ser fonte de material do espaço.

Fonte da notícia: http://www.jpl.nasa.gov/releases/2003/1.cfm
e http://www.astro.queensu.ca/~wiegert/AA29/AA29.html