Perscrutando as manchas solares

2002-11-21

Imagens obtidas pelo Telescópio Solar Sueco de 1 metro (La Palma, Canárias) em que a graduação dos eixos é de 100 km. Topo: pequenas manchas solares com linhas muito finas e escuras à volta do bordo - os \"cabelos\"; a superfície solar à volta revela linhas escuras denominadas \"canais\". Baixo: os filamentos da penumbra possuem núcleos escuros e um dos filamentos parece estar torcido. Crédito: Real Academia das Ciências da Suécia.
Os primeiros resultados científicos baseados em imagens e filmes obtidos com o Telescópio Solar Sueco de 1 metro (Ilha de La Palma, Canárias) foram publicados na revista Nature de Novembro de 2002. Trata-se das imagens do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
com maior resolução espacial alguma vez alcançada, revelando detalhes das manchas solares até agora desconhecidos. De particular interesse é a descoberta de núcleos escuros nos filamentos brilhantes da penumbra das manchas solares.

Depois de quase 400 anos de estudo científico, as manchas solares ainda permanecem um mistério. Sabe-se que são concentrações de campos magnéticos
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
fortes e que são regiões mais frias que o resto da superfície solar, parecendo, por isso, escuras no disco solar. Mas como se formam, porque são estáveis ao ponto de existirem durante semanas e qual a razão para o ciclo de actividade solar
actividade solar
A actividade solar consiste no conjunto de fenómenos ou processos físicos que se manifestam, com maior ou menor intensidade, durante o ciclo solar. Por exemplo, fazem parte da actividade solar a ocorrência de manchas solares, as protuberâncias, o vento solar, ou as ejecções de matéria coronal.
provocar um máximo do número de manchas solares em cada 11 anos, são ainda perguntas sem resposta. Uma mancha solar suficientemente grande consiste numa zona escura de sombra, que é a zona mais fria da mancha, envolta numa penumbra mais brilhante. Sabe-se que a penumbra é uma estrutura dinâmica que consiste em filamentos muito finos por onde o gás flui. Mas os mecanismos que provocam estes fluxos de gás na penumbra e a verdadeira razão de existência da penumbra são ainda desconhecidos.

A chave para o estudo das manchas solares é a resolução espacial. Muitos processos fundamentais na atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
solar ocorrem em escalas menores do que 100 km, só agora observáveis com o telescópio solar sueco. A estrutura dos filamentos da penumbra, assim como a estrutura dos pontos de concentração de campo magnético fora das manchas, contêm informação essencial para a compreensão das manchas solares e até agora ainda não tinham sido observadas.

Em teoria, a resolução espacial aumenta com o diâmetro dum telescópio; mas na prática, há que ter em conta a mistura turbulenta de ar quente e frio na atmosfera que deforma as imagens. A este efeito chama-se seeing (diz-se que o seeing é bom quando a atmosfera está estável e as imagens são bem definidas). As observações do Sol são particularmente afectadas pois realizam-se durante o dia, com o Sol a aquecer a atmosfera. A atmosfera limita a resolução espacial que um telescópio pode alcançar ao ponto de praticamente não valer a pena aumentar o diâmetro dum telescópio solar mais do que 1/2 metro. Para contornar o problema, desenvolveu-se recentemente uma técnica chamada de óptica adaptativa
óptica adaptativa
A técnica de óptica adaptativa é um sistema óptico que se instala nos telescópios terrestres por forma a corrigir, em tempo real, os efeitos da turbulência atmosférica.
, cujo objectivo é compensar o efeito de distorção da atmosfera. O Telescópio Solar Sueco utiliza esta técnica. O espelho adaptativo altera a sua forma 1000 vezes por segundo de modo a ajustar-se à distorção da imagem, permitindo que o telescópio atinga o seu limite de difracção
difracção
A difracção é o fenómeno observado quando a radiação, ao propagar-se, encontra um obstáculo opaco ou passa por uma abertura muito estreita. As ondas de radiação que passam mais próximas do bordo do obstáculo são deflectidas, de forma que: por um lado, contornam o obstáculo e aparecem na região que devia ser de sombra, tornando a fronteira entre a zona de sombra e a zona iluminada pouco definida; e por outro lado, interagem com as ondas de radiação mais próximas, resultando em aumentos e diminuições da intensidade da radiação fora da região de sombra do obstáculo - são os padrões de difracção. A difracção é uma propriedade ondulatória.
. Por último, utilizam-se técnicas de tratamento de imagem para ainda tornar mais bem definidas as imagens capturadas pelas câmaras electrónicas. Torna-se assim possível obter imagens do Sol com uma resolução que ronda os 0,1 segundos de arco
segundo de arco (")
O segundo de arco (") é uma unidade de medida de ângulos, ou arcos de circunferência, correspondente a 1/60 de minuto de arco, ou seja, 1/3600 de grau.
!

Uma descoberta impressionante resultante da alta resolução das primeiras imagens de manchas solares é a revelação da existência de núcleos escuros dentro das penubras brilhantes. Embora esta descoberta, assim como a de outras novas estruturas, possam acrescentar mais mistérios às manchas solares, serão estas as características que definirão testes críticos que todos os modelos teóricos terão de explicar. Do lado técnico, isto quer dizer que finalmente podemos examinar a superfície solar com uma resolução melhor do que 100 km.

Mas a importância destas descobertas vai mais além da compreensão do fenómeno das manchas solares. O Sol é o único objecto astrofísico suficientemente perto de nós para permitir estudarmos com grande detalhe a interacção dum plasma
plasma
O plasma é um gás completamente ionizado, em que a temperatura é demasiado elevada para que os átomos existam como tal, sendo composto por electrões e núcleos atómicos livres. É chamado o quarto estado da matéria, para além do sólido, líquido e gasoso.
com campos magnéticos. Sendo as condições na atmosfera solar e noutros lugares do universo tão extremas que se tornam impossíveis de reproduzir em laboratório, as observações do campo magnético na atmosfera solar adquirem particular importância para a astrofísica em geral.

Fonte da notícia: http://www.astro.su.se/groups/solar/solar.html