Descoberta a origem da radiação infravermelha de fundo

2016-03-14

Em cima: Impressão artística da CIB (radiação infravermelha de fundo), cuja origem se descobriu com a ajuda do ALMA. Crédito: NAOJ, Fujimoto et al. Em baixo: Exemplos de objetos ténues observados com o ALMA (contorno vermelho) e com o Subaru (cor). O ALMA deteta emissões da poeira em galáxias observadas em ótico/infravermelho. Crédito: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO), NAOJ, Fujimoto et al.
Uma equipa de investigadores conseguiu, graças ao ALMA
Atacama Large Millimeter Array (ALMA)
O ALMA é um interferómetro no domínio do rádio, mais precisamente, do milímetro e submilímetro. O instrumento, ainda em construção, situa-se a 5000 metros de altitude na planície de Chajnantor, em plenos Andes chilenos, e será constituído por 64 antenas de 12 m de diâmetro. A sua função principal será observar regiões frias do Universo, que são opticamente opacas. O ALMA é uma parceria da Europa com a América do Norte, em cooperação com o Chile.
(Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), detetar a mais fraca fonte de ondas milimétricas até hoje observada. Acumulando dados de ondas milimétricas provenientes de objetos ténues distribuídos por todo o Universo, a equipa chegou à conclusão que estes são totalmente responsáveis pela enigmática luz infravermelha
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
de fundo. Ao comparar os dados a imagens óticas e infravermelhas, a equipa descobriu que 60% destas fontes são galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
ténues, não tendo as restantes correspondência em comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
óticos/infravermelhos, pelo que a sua natureza é ainda desconhecida.

Embora o Universo pareça escuro, nos intervalos entre estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
e galáxias, os astrónomos descobriram que existe uma luz ténue, mas uniforme, chamada "radiação cósmica de fundo", proveniente de todas as direções. Esta emissão de fundo divide-se em três partes: a COB (Cosmic Optical Background – radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
ótica de fundo), a CMB (Cosmic Microwave Background – radiação de fundo em micro-ondas
microondas
A região do espectro electromagnético, no domínio do rádio, com comprimento de onda entre aproximadamente 1 mm e 30 cm (equivalente ao intervalo de frequências entre 300 GHz e 1 GHz) é a região das microondas.
) e a CIB (Cosmic Infrared Background – radiação infravermelha de fundo).

As origens dos dois primeiros tipos de radiação já se conhecem. A COB vem de um grande número de estrelas e a CMB vem de emissões de gás quente geradas logo após o Big Bang. Faltava, no entanto, revelar a origem da CIB. Foram realizados vários projetos de investigação, incluindo observações com o ALMA feitas no passado, mas só permitiram explicar metade da CIB.

Uma equipa de investigação, liderada por Seiji Fujimoto, um estudante de pós-graduação da Universidade de Tóquio, e por Masami Ouchi, professor associado da mesma universidade, examinou o arquivo de dados do ALMA para estudar esta misteriosa radiação infravermelha de fundo. O ALMA é a ferramenta perfeita para investigar a origem da CIB, graças à sua sensibilidade e resolução sem precedentes.

A equipa analisou uma grande quantidade de dados, recolhidos pelo ALMA durante cerca de 900 dias, em busca de objetos fracos. Procuraram também fontes submetidas a lentes gravitacionais
efeito de lente gravitacional
O efeito de lente gravitacional consiste na deflexão da luz provocada pelo campo gravitacional muito forte de um objecto que se encontra entre o observador e a fonte de luz. Por exemplo, uma galáxia, ou um enxame de galáxias, que se encontre entre nós e um objecto astronómico muito distante, como um quasar, pode actuar como uma lente gravitacional. Tipicamente, o efeito de lente gravitacional faz com que se observe, numa única fotografia, mais do que uma imagem do mesmo objecto.
, em que a enorme gravidade da lente amplia as emissões da fonte tornando visíveis até os objetos mais fracos.

"A origem da CIB tem sido uma peça em falta na energia que vem do Universo", disse Seiji Fujimoto, agora a estudar no Instituto de Investigação de Raios Cósmicos da Universidade de Tóquio. "Dedicámo-nos a analisar a imensa quantidade de dados do ALMA para encontrarmos a peça que faltava."

A equipa descobriu, por fim, 133 objetos ténues, entre os quais um objeto cinco vezes mais ténue que qualquer outro já detetado. Segundo os investigadores, a totalidade da CIB pode ser explicada pela soma das emissões de objetos como estes (nota).

Mas qual é a natureza destas fontes? Comparando os dados ALMA com dados obtidos pelo telescópio espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
e pelo telescópio Subaru
Subaru Telescope
O Telescópio Subaru é um telescópio óptico e de infravermelhos, com um espelho de 8,2 m de diâmetro. O Subaru encontra-se no Observatório de Mauna Kea, no Havai, e é operado pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão – NAOJ e pelo Instituto Nacional de Ciências Naturais.
, a equipa descobriu que 60% são galáxias que também são visíveis em imagens óticas e infravermelhas. A poeira existente nas galáxias absorve luz visível
radiação visível
A radiação visível é a região do espectro electromagnético que os nossos olhos detectam, compreendida entre os comprimentos de onda de 350 e 700 nm (frequências entre 4,3 e 7,5x1014Hz). Os nossos olhos distinguem luz visível de frequências diferentes, desde a luz violeta (radiação com comprimentos de onda ~ 400 nm), até à luz vermelha (com comprimentos de onda ~ 700 nm), passando pelo azul, anil, verde, amarelo e laranja.
e infravermelhos e reemite a energia em ondas milimétricas mais longas que podem ser detetadas com o ALMA.

"No entanto, não sabemos o que são as restantes fontes. Deduzo que sejam galáxias obscurecidas pela poeira. Por serem tão escuras, tratar-se-á de galáxias de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
muito baixa." explicou Masami Ouchi, entusiasmado. "Isto traduz-se na existência de pequenas galáxias contendo grandes quantidades de poeira, o que entra em conflito com os nossos conhecimentos atuais, que consideram que as galáxias pequenas devem conter pequenas quantidades de poeira. Os resultados que obtivemos podem indicar que existem muitos objetos inesperados no Universo distante. Estamos ansiosos por descobrir estas novas fontes enigmáticas em futuras observações do ALMA."

Nota: O ALMA detetou uma parte da CIB com comprimentos de onda de 1 mm. A CIB em ondas milimétricas e submilimétricas não se torna ténue, mesmo se a fonte estiver a uma grande distância. Por isso, este comprimento de onda é adequado para observar a grandes distâncias através do Universo.

Fonte da notícia: http://alma.mtk.nao.ac.jp/e/news/pressrelease/20160310mysterious_infrared_light_from_space_resolved_perfectly.html