Astrónomos descobrem mais detalhes sobre as misteriosas explosões rápidas de rádio

2015-12-03

Impressão artística de uma FRB, explosão rápida de rádio, a chegar à Terra. As cores representam a explosão e chegam em diferentes comprimentos de onda de rádio, com os comprimentos longos (vermelho) a chegarem vários segundos depois dos curtos (azul). Este atraso é devido à dispersão e ocorre quando as ondas de rádio viajam através de plasma cósmico. Crédito: Jingchuan Yu, Beijing Planetarium.
As explosões rápidas de rádio
rádio
O rádio é a banda do espectro electromagnético de maior comprimento de onda (menor frequência) e cobre a gama de comprimentos de onda superiores a 0,85 milímetros. O domínio do rádio divide-se no submilímetro, milímetro, microondas e rádio.
(ou FRBs, do inglês Fast Radio Bursts), breves erupções brilhantes de ondas de rádio cósmicas, têm deixado perplexos os astrónomos desde que foram pela primeira vez relatadas, há quase uma década. Embora pareçam vir do Universo distante, até agora, nenhum desses enigmáticos eventos tinha revelado grandes detalhes sobre como e onde tivera origem.

Investigando mais de 650 horas de dados de arquivo do telescópio GBT
Green Bank Telescope (GBT)
O Robert C. Byrd Green Bank Telescope (GBT) é o maior radiotelescópio de uma só antena totalmente dirigível. O prato da antena do GBT mede 100 por 110 metros. O observatório em Green Bank é operado pela NRAO (National Radio Astronomy Observatory).
(Green Bank Telescope) da NSF (National Science Foundation), uma equipa de astrónomos descobriu o registo mais detalhado da história de uma FRB. A investigação indica que a explosão teve origem dentro de uma região altamente magnetizada do espaço, possivelmente ligando-a a uma supernova
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
recente ou ao interior de uma nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
de formação estelar ativa.

"Sabemos agora que a energia desta FRB passou por uma região densa, magnetizada, pouco depois de se ter formado. Isso reduz significativamente o ambiente da fonte e o tipo de evento que desencadeou a explosão," disse Kiyoshi Masui, astrónomo da Universidade da Colúmbia Britânica e do Instituto Canadiano de Pesquisa Avançada.

Com a duração de apenas uma fração de segundo, embora envolvendo uma quantidade fenomenal de energia, as FRBs são breves flashes de rádio de origem desconhecida que parecem vir de direções aleatórias no céu. Os astrónomos acreditam que o Universo observável
Universo observável
Chama-se Universo observável a tudo o que pode ser observado até ao limite em que, no passado, e de acordo com os modelos teóricos, o Universo era opaco, ou seja, quando tinha uma idade de apenas cerca de 300 mil anos.
seja diariamente abalado por milhares destes eventos, embora apenas um pequeno número deles tenha sido anteriormente documentado.

Examinando dados para localizar eventos elusivos

Os astrónomos descobriram a FRB identificada, FRB 110523, usando software altamente especializado desenvolvido por Masui e o seu colega Jonathan Sievers, da Universidade de KwaZulu-Natal, em Durban, África do Sul.

Os dados registados - num total de 40 terabytes - geraram um substancial desafio de análise, que se tornou ainda mais difícil porque o sinal de uma FRB, que seria curto e intenso, é dispersado em frequência
frequência
Num fenómeno periódico, a frequência é o número de ciclos por unidade de tempo.
devido à sua viagem através do espaço.

Esta dispersão do sinal de rádio, conhecida como atraso de dispersão, é muitas vezes utilizada para estimar a distância em radioastronomia: quanto maior é a dispersão, mais longe o objeto está da Terra. Neste caso, a medida de dispersão sugere que a FRB teve origem a uma distância de 6 mil milhões de anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
.

No entanto, a dispersão mascara a presença de uma FRB nos dados rádio de arquivo. O novo software diminuiu o tempo necessário para analisar os dados, neutralizando os efeitos de dispersão e restabelecendo a aparência original da explosão.

A equipa de investigadores – na sua maioria com formação em cosmologia - usou este software para levar uma passagem inicial dos dados GBT a detetar qualquer sinal candidato. Resultaram mais de 6000 possíveis FRBs, que foram examinadas individualmente por Hsiu-Hsien Lin, membro da equipa, da Universidade Carnegie Mellon, em Pittsburgh. A sua análise limpou o campo até permanecer apenas um candidato.

Detalhes Escondidos na Polarização

O sinal era, no entanto, excecional e continha mais detalhes sobre a sua polarização do que qualquer outro já identificado. Antes desta deteção, apenas a polarização circular tinha sido associada a uma FRB. O novo estudo dos dados GBT inclui a deteção de polarização circular e linear.

"Escondido num conjunto de dados incrivelmente grande, encontrámos um sinal muito peculiar, que concordava com todas as caraterísticas conhecidas de uma explosão rápida de rádio, mas com um elemento de polarização adicional que nunca tínhamos visto antes," disse Jeffrey Peterson, do Centro McWilliams para a Cosmologia da Carnegie Mellon.

A polarização é uma propriedade da radiação electromagnética
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
que indica a orientação da onda. Os óculos polarizados usam esta propriedade para bloquear uma parte dos raios solares e o cinema 3-D usa-a para conseguir a ilusão de profundidade.

Os investigadores usaram esta informação adicional para determinarem que a luz de rádio da FRB revelava rotação Faraday, rotação do plano de polarização das ondas de rádio, adquirida pela passagem através de um poderoso campo magnético
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
.

"Isto diz-nos algo sobre o campo magnético que a FRB atravessou no seu caminho até nós, dando-nos pistas sobre o ambiente da explosão", explicou Masui. "Também dá mais trabalho aos teóricos quando tentam apresentar explicações para estas explosões."

As medições do atraso devido à dispersão podem ainda ser usadas para estabelecer um limite inferior para o tamanho da região da fonte. Neste caso, a medição excluiu modelos de FRBs que envolvessem estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
da nossa Galáxia
Via Láctea
A Via Láctea é a galáxia de que faz parte o nosso Sistema Solar. Trata-se de uma galáxia espiral gigante, com um diâmetro de cerca de 160 mil anos-luz e uma massa da ordem de 100 mil milhões de vezes a massa do Sol.
e, pela primeira vez, mostrou que a FRB deve ter tido origem noutra galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
.

Uma análise mais aprofundada do sinal revelou ainda que este passou por duas regiões distintas de gás ionizado
ionização
Processo pelo qual um átomo (ou molécula) electricamente neutro ganha ou perde um ou mais electrões, transformando-se num ião.
, ou telas, no seu caminho em direção à Terra. Usando o efeito combinado das duas telas, os astrónomos foram capazes de determinar as suas posições relativas. A tela mais forte está muito próxima da fonte da explosão – a menos de cem mil anos-luz – o que implica que fica dentro da galáxia da fonte. Apenas duas coisas poderiam deixar uma marca deste tipo no sinal: uma nebulosa em torno da fonte, ou o ambiente próximo do centro de uma galáxia.

"No conjunto, estes dados notáveis revelam mais sobre uma FRB do que alguma vez tínhamos visto e fornecem-nos importantes limites para estes eventos misteriosos", conclui Masui. "Temos também uma nova e estimulante ferramenta para pesquisar nos dados de arquivo de forma a podermos descobrir mais eventos deste tipo e podermos compreender verdadeiramente a sua natureza."

Os resultados foram publicados na revista Nature.

Fonte da notícia: http://phys.org/news/2015-12-team-mysterious-fast-radio.html