Vénus é habitualmente apontado como um dos planetas onde a vida, tal como a conhecemos, não é possível devido à sua superfície infernalmente quente e ácida. Mas as condições existentes na atmosfera, a uma altitude de aproximadamente 50 quilómetros, são relativamente hospitaleiras: a temperatura ronda os 70º C, com uma pressão de cerca de 1 atmosfera. Apesar de as nuvens serem muito ácidas, esta região contém a maior concentração de gotas de água da atmosfera venusiana.

A fim de procurar hipotéticos sinais de vida, uma equipa de investigadores da Universidade do Texas (EUA) reanalisou os dados obtidos pelas sondas Venera (Rússia), Pioneer e Magalhães (EUA). Notaram, então, alguns aspectos peculiares relativos à composição química da atmosfera de Vénus. A radiação solar e os relâmpagos deveriam produzir grandes quantidades de monóxido de carbono na atmosfera do planeta, mas, pelo contrário, existe muito pouca quantidade deste gás, como se algo o estivesse a remover. Encontraram, também, sulfito de hidrogénio e dióxido de enxofre. Dado que estes dois gases reagem mutuamente, em condições normais nunca são encontrados juntos, a não ser que algo os esteja a produzir.

Ainda mais misteriosa é a presença de sulfito carbonil. Este gás é tão difícil de produzir inorganicamente que, por vezes, é mesmo considerado um indicador claro de actividade biológica. É possível que existam formas não biológicas de produzir o sulfito de hidrogénio, ou o sulfito carbonil, que nós desconhecemos, mas ambas as reacções necessitam de catalisadores para se processarem eficientemente. Na Terra, os catalisadores mais eficientes são os micróbios.

Esta equipa de investigadores acredita que possam existir microorganismos nas nuvens de Vénus que combinam o dióxido de enxofre com monóxido de carbono e, possivelmente, com hidrogénio, para produzir sulfito de hidrogénio ou sulfito carbonil, num metabolismo similar àquele que terá ocorrido em microorganismos na Terra, aquando do aparecimento da vida. Os cientistas sugerem ainda que os microorganismos poderiam estar a utilizar a radiação ultravioleta proveniente do Sol como fonte de energia, o que poderia explicar a presença de manchas escuras nas imagens do planeta obtidas em ultravioleta.

Esta hipótese não é, de modo algum, pacífica. Há quem defenda que, para a existência de vida, é necessário um determinado volume de água, e não apenas gotículas de água. No entanto, também é verdade que existem evidências químicas que parecem indicar que Vénus terá sido, em determinada fase da sua evolução, mais frio e que, por isso, possa ter possuído oceanos. A vida poderá ter-se iniciado aí e, posteriormente, ter-se retirado para nichos mais estáveis, quando se iniciou o processo que levou ao actual estado de permanente efeito de estufa no planeta.

A missão Venus Express, da Agência Espacial Europeia (ESA), que irá investigar a atmosfera do planeta, está prevista para ser lançada em 2005. Entretanto, a Agência Espacial Sueca busca parceiros internacionais para desenvolver a sua ideia de uma missão que deverá trazer para a Terra uma amostra da atmosfera de Vénus. Esta missão deverá ocorrer no virar da década. Ou seja, talvez só daqui a uns quantos anos possa ser possível esclarecer esta hipótese avançada pelos investigadores da Universidade do Texas.

Fonte da notícia: http://www.newscientist.com