AVISO
Ditos
"Deveríamos ter cuidado para não fazermos do intelecto o nosso deus; ele tem certamente músculos poderosos, mas não tem personalidade."- Albert Einstein
Lotaria Climática
2007-06-14
Na constelação do Unicórnio fiz uma pausa numa daquelas estações de serviço que fazem lembrar as tascas da “Guerra das Estrelas”. Foi aí, no meio de uma cacofonia infernal que tomei conhecimento de uma história planetária que não pode deixar indiferente os terráqueos deste início do século XXI: a história dramática do planeta Corot-exo-63d.
O planeta Corot-exo-63d tem a particularidade de descrever uma órbita muito excêntrica à volta da sua estrela. Esta excentricidade orbital origina uma variação de temperatura assinalável à superfície durante uma órbita completa, cujo período é equivalente a 95 anos terrestres. Os coroteanos desenvolveram uma forma de adaptação muito particular às variações do clima que lhes permite sobreviver à fase mais fria do planeta (cerca de 15 anos terrestres) quando este se encontra na secção da trajectória mais afastada do seu sol. Durante esta fase ocorrem transformações importantes na atmosfera e à superfície do planeta, em particular a formação de uma espessa crosta de gelo. Os coroteanos desenvolveram um ciclo de vida em fase com a órbita planetária, funcionando como um autêntico contrato geracional biológico.
O ciclo de vida de cada geração de coroteanos coincide exactamente com o período orbital. Cada geração brota quando o planeta deixa a fase fria da trajectória orbital. À medida que a temperatura do planeta aumenta e o degelo progride, as condições de vida à superfície do planeta tornam-se mais favoráveis aos coroteanos. Ao longo da trajectória do planeta Corot 63d em torno da sua estrela, a nova geração cresce e desenvolve-se graças aos recursos naturais do planeta e aos recursos herdados das gerações anteriores, sobretudo graças ao legado cultural deixado pela geração anterior, que serve como um livro de instruções de vida para a nova geração.
Durante milénios os coroteanos ergueram uma civilização com alto grau de sucesso, desenvolvendo-se rapidamente, pacificamente, melhorando a sua qualidade de vida substancialmente de geração em geração. Mas o seu sucesso foi também a sua maldição. O sucesso dos coroteanos gerou um excesso de confiança que lhes foi fatal.
Num dos ciclos geracionais chegou-se à conclusão que o aumento da actividade dos coroteanos estava a reduzir drasticamente a biodiversidade do planeta, principalmente entre os microrganismos. Descobriu-se que o desaparecimento progressivo de um dos microrganismos do planeta evoluía na mesma proporção que o aumento do período de degelo que ocorria no final de cada fase fria. Cientificamente demonstrou-se que estes microrganismos eram absolutamente inactivos a temperaturas baixas.
Após o anúncio deste resultado, a polémica instalou-se entre os coroteanos. Uns, apesar das incertezas científicas sobre os microrganismos, defendiam que o seu modo de vida deveria ser reformulado para controlar o problema do degelo, outros eram partidários de que o problema era uma mera flutuação estatística e de que nada deveria mudar no seu quotidiano. A relação causa-efeito entre o desaparecimento dos microrganismos e o degelo prolongado não ficou claramente estabelecida. A comunidade científica estimou em 10% a probabilidade de ocorrência de um longo e dramático período de degelo. No entanto, essa geração avançou para a passagem de testemunho para a geração seguinte assumindo esses 10% de risco.
Nada foi feito para contrariar esse risco, e aliás, pouco poderia ser feito desde o momento em foi anunciada a conclusão dos cientistas. O risco era baixo, mas existia. Os coroteanos tiveram azar e saiu-lhes na lotaria climática as consequências nefastas de um degelo prolongado. Soube-se mais tarde que os microrganismos ameaçados de extinção eram fundamentais para a respiração das espécies dominantes do planeta durante a fase fria e que a concentração de um dos subprodutos dessa respiração tinha um papel determinante no aceleramento do degelo do planeta. A respiração dessas espécies foi reduzida ao mínimo e a escassez dos referidos subprodutos fez o resto. A insuficiente de provisão energética para um período de degelo mais prolongado impediu que mais de 75% da nova geração conseguisse nascer e sobreviver. Os coroteanos sofreram um forte retrocesso civilizacional do qual ainda hoje não recuperaram.
Recentemente, no planeta Terra, o Painel Governamental Internacional para as Alterações Climáticas publicou um relatório revisto por cerca de 2500 investigadores especialistas em climatologia e que teve a contribuição escrita de mais de 1000 investigadores de 130 países. A conclusão principal deste relatório atribui uma probabilidade superior a 90% à hipótese de o aquecimento global ser originado pela actividade humana.
E nós, terráqueos? Vamos imitar os coroteanos? Vamos jogar na lotaria climática?
O planeta Corot-exo-63d tem a particularidade de descrever uma órbita muito excêntrica à volta da sua estrela. Esta excentricidade orbital origina uma variação de temperatura assinalável à superfície durante uma órbita completa, cujo período é equivalente a 95 anos terrestres. Os coroteanos desenvolveram uma forma de adaptação muito particular às variações do clima que lhes permite sobreviver à fase mais fria do planeta (cerca de 15 anos terrestres) quando este se encontra na secção da trajectória mais afastada do seu sol. Durante esta fase ocorrem transformações importantes na atmosfera e à superfície do planeta, em particular a formação de uma espessa crosta de gelo. Os coroteanos desenvolveram um ciclo de vida em fase com a órbita planetária, funcionando como um autêntico contrato geracional biológico.
O ciclo de vida de cada geração de coroteanos coincide exactamente com o período orbital. Cada geração brota quando o planeta deixa a fase fria da trajectória orbital. À medida que a temperatura do planeta aumenta e o degelo progride, as condições de vida à superfície do planeta tornam-se mais favoráveis aos coroteanos. Ao longo da trajectória do planeta Corot 63d em torno da sua estrela, a nova geração cresce e desenvolve-se graças aos recursos naturais do planeta e aos recursos herdados das gerações anteriores, sobretudo graças ao legado cultural deixado pela geração anterior, que serve como um livro de instruções de vida para a nova geração.
Durante milénios os coroteanos ergueram uma civilização com alto grau de sucesso, desenvolvendo-se rapidamente, pacificamente, melhorando a sua qualidade de vida substancialmente de geração em geração. Mas o seu sucesso foi também a sua maldição. O sucesso dos coroteanos gerou um excesso de confiança que lhes foi fatal.
Num dos ciclos geracionais chegou-se à conclusão que o aumento da actividade dos coroteanos estava a reduzir drasticamente a biodiversidade do planeta, principalmente entre os microrganismos. Descobriu-se que o desaparecimento progressivo de um dos microrganismos do planeta evoluía na mesma proporção que o aumento do período de degelo que ocorria no final de cada fase fria. Cientificamente demonstrou-se que estes microrganismos eram absolutamente inactivos a temperaturas baixas.
Após o anúncio deste resultado, a polémica instalou-se entre os coroteanos. Uns, apesar das incertezas científicas sobre os microrganismos, defendiam que o seu modo de vida deveria ser reformulado para controlar o problema do degelo, outros eram partidários de que o problema era uma mera flutuação estatística e de que nada deveria mudar no seu quotidiano. A relação causa-efeito entre o desaparecimento dos microrganismos e o degelo prolongado não ficou claramente estabelecida. A comunidade científica estimou em 10% a probabilidade de ocorrência de um longo e dramático período de degelo. No entanto, essa geração avançou para a passagem de testemunho para a geração seguinte assumindo esses 10% de risco.
Nada foi feito para contrariar esse risco, e aliás, pouco poderia ser feito desde o momento em foi anunciada a conclusão dos cientistas. O risco era baixo, mas existia. Os coroteanos tiveram azar e saiu-lhes na lotaria climática as consequências nefastas de um degelo prolongado. Soube-se mais tarde que os microrganismos ameaçados de extinção eram fundamentais para a respiração das espécies dominantes do planeta durante a fase fria e que a concentração de um dos subprodutos dessa respiração tinha um papel determinante no aceleramento do degelo do planeta. A respiração dessas espécies foi reduzida ao mínimo e a escassez dos referidos subprodutos fez o resto. A insuficiente de provisão energética para um período de degelo mais prolongado impediu que mais de 75% da nova geração conseguisse nascer e sobreviver. Os coroteanos sofreram um forte retrocesso civilizacional do qual ainda hoje não recuperaram.
Recentemente, no planeta Terra, o Painel Governamental Internacional para as Alterações Climáticas publicou um relatório revisto por cerca de 2500 investigadores especialistas em climatologia e que teve a contribuição escrita de mais de 1000 investigadores de 130 países. A conclusão principal deste relatório atribui uma probabilidade superior a 90% à hipótese de o aquecimento global ser originado pela actividade humana.
E nós, terráqueos? Vamos imitar os coroteanos? Vamos jogar na lotaria climática?