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"Se estás a trabalhar em algo novo, então és necessariamente um amador."
- John Wheeler


O que se passa em Quaoar ?

2004-12-14

Representação artística de Quaoar na cintura de Kuiper (STScI).
Contrariamente ao que alguns pensam, o nosso Sistema Solar não termina com Plutão – o último planeta do Sol descoberto em 1930 pelo astrónomo-amador Clyde Tombaugh. Na verdade, Plutão sempre pareceu um planeta estranho, não só pelo seu reduzido tamanho, mas, particularmente, pelos seus parâmetros orbitais: uma grande excentricidade e uma inclinação enorme relativamente ao plano da eclíptica. Depois de conhecidos os “Planetas Gigantes”, para lá da órbita dos asteróides, tudo indicaria que qualquer planeta tivesse características gasosas, típicas e semelhantes a Júpiter, Saturno, Úrano e Neptuno. Mas assim não aconteceu: Plutão a 5,9 mil milhões km do Sol mostrou-se como um mundo diferente, um planeta de gelo e rocha que poucos sabem interpretar.

Plutão é um dos muitos outros corpos que existem nas profundezas longínquas do nosso sistema, ainda antes do reino dos cometas, corpos de gelo e rocha, que formam os limites que nos separam das estrelas. Mas Plutão não se encontra sozinho. Muito depois da sua descoberta, numerosos outros corpos, de dimensões menores ou semelhantes a Plutão, foram descobertos, algo que levaria hoje a uma redefinição do que se entende por planeta, ao meu tempo, ao tempo do meu pai e do meu avó, um corpo que reflecte a luz proveniente de uma estrela, neste caso o Sol. Daí que a tradição, esquecendo as dúvidas genéticas, seja para ser mantida.

A 7 de Outubro de 2002, os astrónomos anunciaram a descoberta de um objecto maior, cerca de metade do tamanho de Plutão, um enorme calhau composto de gelo e rocha que orbita o Sol em 288 anos. Chamado de Quaoar (deve pronunciar-se “qua-o-ar”), o objecto reside na Cintura de Kuiper, uma região do Sistema Solar que se estende para lá da órbita de Plutão e que corresponde a corpos rochosos com uma enorme fracção de gelo – restos conservados dos primeiros condensados do Sistema Solar.


Espectro de reflexão do gelo de água (a vermelho) comparado com o espectro obtido para Quaoar (cortesia de David Jewitt e “Nature”)
Quaoar, com um diâmetro de 1 200 km, foi descoberto pelo Telescópio Espacial Hubble e, em volume, apresenta-se superior a todos os asteróides conhecidos, mostrando-se um corpo de características próprias, semelhante a outros que têm sido descobertos para lá da órbita de Neptuno. Entre eles estão mais de 400 objectos da Cintura de Kuiper. Os astrónomos pensam que mais de mil milhões destes corpos existam nesta região embora um recenseamento esteja longe de ser feito. Varuna e Sedna, este último com mais de 1200 km de diâmetro, são dois dos novos planetóides representativos desta cintura de gelo e rocha, com efeito um tipo de corpos que se assume com um comportamento intermédio entre os cometas e os asteróides, quiçá, uma nova classe a ser considerada na futura terminologia da população solar.

Um novo estudo (1), efectuado pelo astrónomo David Jewitt, do Instituto de Astronomia da Universidade do Hawai, mostra que a superfície de Quaoar está coberta de gelos de hidratos de amónia e gelo de água. Como esperado, ambas as substâncias são destruídas em poucos milhões de anos pela radiação cósmica, pelo que a sua presença na superfície de Quaoar implica, conforme nos disse David Jewitt, uma cobertura recente criada por um tipo estranho de criovulcanismo (vulcões a frio) que os astrónomos e os planetólogos não sabem explicar. O que se pensa, como afirmou Jewitt, é que “a superfície de Quaoar seja continuamente coberta por gelos cujos fluidos originais se libertam do interior”.

Esta conclusão, sem dúvida baseada em fortes observações, é não só intrigante como carece de uma importante explicação: que tipo de aquecimento poderia levar ao “vulcanismo” neste mundo distante do Sol? Os geólogos, certamente, não têm nenhuma certeza e duvido que alguém se atreva a apresentar uma. Este será um dos aspectos a ser estudados nos muitos corpos que formam a Cintura de Kuiper e que na próxima década serão observados, juntamente com Plutão, pela sonda automática “New Horizons”.

(1) “Nature”, Vol. 432, 9 Dezembro 2004